sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Poesia > [ Tudo em mim é de tal forma comum que ... ]

 

Distraído, Azizi tinha engolido um caroço de cereja

pouco antes de o anjo da morte — que é todo coberto

de olhos — o ter beijado. Depois de morto e enterrado,

do corpo de Tal Azizi cresceu uma árvore. Uma bela

cerejeira, de madeira escura.

(Enciclopédia da Estória Universal — Antologia de Théophile Morel)

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Como é que te vou ouvir se és mudo? Não te preocupes;

cá me arranjo. Aprendi a ouvir as palavras que não se dizem;

e a ler as que se formam na cabeça e juramos não pronunciar.

Imagina simplesmente que falas, e eu ouvir-te-ei. Pensa que

falas, e falarás. Confias em mim?

(Testamento de um poeta judeu assassinado, Elie Wiesel)

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De certeza que já te cruzaste comigo mil vezes, mas o teu

olhar nunca se fixou em mim. Admiras-te? Sou assim: não

atraio a atenção. Sou um camaleão humano ou algo parecido.

Dissolvo-me no que me rodeia, faço parte da paisagem:

não tenho nada em que os olhos se prendam. Tudo em mim

é de tal forma comum que as pessoas olham e não me vêem.

(Testamento de um poeta judeu assassinado, Elie Wiesel)

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